As belezas de Belo Horizonte se desvelam nos detalhes simbolizados pelas ondulações sinuosas da Serra do Curral, nos arrojados traços (da arte e da arquitetura) dos seus monumentos históricos ou ainda no incessante movimento de suas ruas, alamedas e avenidas. Para conquistar a intimidade dessa metrópole eclética e cosmopolita de 124 anos, é preciso andar pela cidade sempre atento, com o mesmo olhar de um explorador. O encantamento virá aos poucos, em calculadas porções de cada beleza revelada.
Por Cezar Félix, texto e fotos
Andar pelas ruas da cidade de um jeito diferente, nem em (des)embalada correria — como, aliás, é de praxe aqui, nessas alterosas, é o que exige a sua agitada, fria e calculista rotina na luta pelo pão que precisa ser ganho a cada dia — nem em passadas lentas a ponto de se parecer alheio ao que acontece (e o que revela) a cada esquina. Belo Horizonte é uma capital astuta, esperta (assim como o mineiro), pede argúcia ao observador.
As suas belezas são desveladas nos detalhes, seja nas sinuosas ondulações da Serra do Curral seja nos traços da arquitetura dos edifícios históricos ou no sobe e desce incessante de muitas das ruas, alamedas e avenidas. Mesmo na época dos ipês que florescem a urbe de rosa, branco ou amarelo, as belezas estão de certo modo ocultas, como que a exigir tempo e paciência do observador. Portanto, é preciso andar pelas ruas de BH sempre atento, com o olhar de um explorador. O encantamento virá aos poucos, em calculadas porções de cada beleza revelada. A partir daí, a paixão pela cidade é certa.
Belo Horizonte é uma capital eclética. Apesar de 120 anos de crescimento desordenado — refletido principalmente na desumana ocupação dos morros e na explosão de uma imensa periferia paupérrima e carente de tudo —, os principais monumentos arquitetônicos da cidade estão aí para contar essa história. Esses tesouros do patrimônio belo-horizontino têm uma importância tão grande para a cidade que extrapolam em muitos níveis o real valor histórico e cultural que possuem. É que eles sobreviveram a uma grotesca especulação imobiliária, que gerou muita feiura urbana espalhada hoje pela metrópole. Talvez o pior exemplo dessa realidade esteja refletido em alguns bairros erguidos exclusivamente para abrigar os mais ricos.
Para resgatar essa história, é preciso voltar aos primórdios da fundação de BH. A descrição que segue abaixo, publicada originalmente no livro “Minas de tantos Geraes – volume 2”, é didática.
Linha do tempo
Uma mistura quase poética de antigas tradições mineiras com aspectos claros de metrópole cosmopolita revela uma cidade construída para substituir a então capital, Ouro Preto, então considerada ultrapassada. Desenhada para caber nos limites da Avenida do Contorno, a primeira cidade planejada do Brasil foi inaugurada em 1897, com uma grande festa no local hoje ocupado pela Praça da Liberdade. À época, alguns dos prédios do entorno estavam prontos, mas a praça em si ainda era apenas um sonho, por vezes ofuscado pelo pó que subia do chão de terra durante a celebração.
Os simbolismos de Belo Horizonte começam nas palmeiras imperiais dessa praça, que se erguem em linha reta de um lado ao outro e convergem os olhares para a residência do então presidente do estado, o Palácio da Liberdade, construção mais imponente do conjunto. Ecletismo é a palavra de ordem no estilo arquitetônico desse e de outros edifícios, que por décadas sediaram secretarias de estado. A inspiração vinha de edifícios de renome do além-mar, de países como França e Inglaterra.
Com o tempo, o espaço ganhou construções em estilo art déco, moderno e contemporâneo e passou a ser conhecido como Conjunto Arquitetônico da Praça da Liberdade. Atualmente, é o espaço da capital mineira que reúne o maior número de inspirações artísticas. Esse foi um dos motivos pelos quais o local foi tombado pelo Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico, em 1977. belo horizonte minas gerais
Requinte de grandes dimensões
Os edifícios foram desenhados a partir da arquitetura eclética, que, como explica Carlos Antônio Leite Brandão, professor da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, traz a sintaxe clássica, porém com novas referências. É, portanto, de inspiração neoclássica, estilo rigoroso quanto à retomada do estilo clássico, mas bebe em outras fontes ao buscar novos materiais e novas formas de compor os ambientes. Várias particularidades do Palácio da Liberdade, por exemplo, ostentam o ecletismo. A varanda suspensa e as duas torres circulares de cada um dos lados do edifício são alguns dos detalhes que fazem mesmo com que o edifício se pareça um palacete. Do lado de dentro, salões com portas de vidro e madeira maciça, mobiliário luxuoso e paredes inteiramente cobertas de motivos decorativos.
Art déco
Mas nem tudo é neoclássico por ali. “A escadaria belga que se encontra dentro do Palácio da Liberdade, por exemplo, não tem nada a ver com o clássico”, exemplifica Brandão. Representante do estilo art nouveau, a escadaria citada pelo professor é um dos elementos que mais chamam atenção no espaço: quase impossível acreditar que os desenhos de folhas e flores do corrimão foram feitos em ferro. Degraus de mármore e um vistoso tapete vermelho completam o visual do objeto, vindo diretamente da Bélgica, para compor a residência do governador.
O art déco, reconhecido pelo uso do revestimento em pó de pedra, se fez presente em algumas das construções erguidas já no século XX. É o caso do Palácio Cristo Rei (ou Palácio Arquiepiscopal), inaugurado em 1937, sede da Arquidiocese de Belo Horizonte, de autoria de Raffaello Berti. Do outro lado da praça, outro digno exemplar, a sede social do Minas Tênis Clube, do mesmo arquiteto, inaugurada em 1940 e tombada pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Belo Horizonte. A fachada, muito bem posicionada na esquina, é imponente, com quinas arredondadas, linhas circulares, formas geométricas e faixas de vitrais. Berti também projetou, no mesmo ano, o Colégio Izabella Hendrix, próximo à praça, na Rua da Bahia, o qual se assemelha ao Palácio Cristo Rei, uma grande edificação retilínea revestida de pó de pedra.
Modernismo em afirmação
Mais tarde, entre os anos 1954 e 1960, o modernismo deu o ar da graça. Surgem o Edifício Niemeyer e a Biblioteca Pública, ambos projetados por Oscar Niemeyer. Há quem diga que, depois do Palácio da Liberdade, o edifício que leva o nome do arquiteto é o endereço mais privilegiado da cidade. Niemeyer foi contratado pela escritora Lucia Machado Almeida, consagrada pelos livros infanto-juvenis, para projetar um edifício no lote da família. O prédio tinha uma peculiaridade: não existia uma relação frente-fundos. O edifício não se limitou a uma fachada, pelo contrário, se desdobrou em várias.
Os planos contínuos de vidro levam a paisagem para dentro do apartamento, porém sem abrir mão da privacidade. As aberturas — incluindo as dos banheiros — não exibem os moradores e não geram exposições excessivas ao sol, em virtude do uso das lajes de proteção solar, chamadas brise-soleil. É uma rara conciliação entre privacidade e abertura para a paisagem. Além disso, as três linhas de brises em cada um dos 11 andares dificultam a contagem do número certo de pavimentos, um artifício bem conhecido do barroco: o ilusionismo.
O edifício é um dos poucos da praça que ainda mantêm o uso inaugural, o de ser um prédio residencial. Os demais, muitos dos quais serviram como secretarias de estado até 2010, quando se deu a inauguração da Cidade Administrativa Presidente Tancredo Neves, foram transformados em museus e espaços culturais. À Praça da Liberdade, uma nova destinação: o Circuito Cultural Praça da Liberdade que já reúne 12 espaços.
Outros edifícios vieram depois e não são menos importantes. Na década de 1960, o antigo prédio do Instituto de Previdência do Estado (Ipsemg), projeto do arquiteto Raphael Hardy Filho, e o Edifício Mape, popularmente chamado de “Prédio do Xodó”, assinado por Sylvio de Vasconcellos, contribuíram para o adensamento modernista do entorno.
Inspiração do contemporâneo
Em 1990 entra em cena o edifício Rainha da Sucata, de Éolo Maia e Sílvio de Podestá, na linha pós-modernista, que reagiu aos dogmas modernistas com ornamentos, cores, mistura de materiais, colagens. O projeto, certamente, reforça aqui o diálogo crítico com os demais edifícios do entorno — não com ares de superioridade, porém com o grito de que o novo e o antigo coexistem.
Para o arquiteto Sylvio de Podestá, essa convivência é o que escreve a história da cidade, desde que sejam respeitadas as variáveis de cada tempo. Coube à “Rainha” a responsabilidade de contar a história dos anos 1980, anos pluralistas, de grande efervescência e discursos cheios de adjetivos e substantivos. A Praça da Liberdade é uma linha do tempo edificada, que revela a livre manifestação da arte temporal, imortalizada por meio da arquitetura.
Saga modernista
Do universal para o local: foi esse o caminho feito pelo modernismo quando saiu das terras europeias e desembarcou no Brasil. Enquanto no resto do mundo o novo movimento artístico buscava criar conceitos globais, no Brasil se impunha a necessidade de valorizar a cultura regional em cada obra. E foi assim, buscando aceitar a cultura estrangeira sem, entretanto, imitá-la que o modernismo tomou forma no país, especialmente depois da Semana de Arte Moderna, realizada em 1922.
Em comum com a Europa, os modernistas nacionais possuíam o ideal de estruturas simples e coloquiais que davam fim à ornamentação exagerada e rocambolesca. Da filosofia à literatura, da economia à moda, das artes plásticas ao urbanismo, o século XX abraçou as linhas e sinuosidades modernas com paixão. Na arquitetura, o período foi marcado pelo racionalismo e pelas obras funcionais, com formas bem definidas, espaços livres, utilização de vidros e perfeita conexão com o paisagismo. A decoração moderada ficava por conta de espetaculares painéis de azulejos decorados, belíssimos murais e esculturas. belo horizonte minas gerais
Durante os primeiros anos, o movimento modernista ficou restrito ao eixo Rio-São Paulo, e só em maio de 1943, Belo Horizonte ganhou o Conjunto Arquitetônico da Pampulha, que se consolidou como um dos maiores representantes do estilo no Brasil e é hoje Patrimônio Cultural da Humanidade. As curvas delineadas por Oscar Niemeyer se harmonizam com perfeição com o entorno da lagoa e parecem brotar de forma natural dos belos jardins criados pelo paisagista Burle Marx. Foi com a execução desse projeto que o então prefeito, Juscelino Kubitschek, arremessou a capital mineira para o cenário artístico nacional. minas gerais belo horizonte minas gerais
Arte e arquitetura em contornos curvos
Os contornos curvos da Lagoa da Pampulha foram fonte de inspiração para o projeto arquitetônico que previa um cassino, um clube de elite, um salão de danças, uma igreja e um hotel. Apenas este último não foi realizado, mas, em compensação, Kubitschek acrescentou a própria casa de veraneio, como se quisesse provar o potencial do local. Seria um grande centro de lazer. O lago completava a belíssima vista dos edifícios e ainda seria usado para a realização de esportes náuticos.
A regra era modernizar. Niemeyer estava livre para criar, e assim o fez. O resultado foi um conjunto no qual cada elemento é visto como uma obra autônoma, mas, ao mesmo tempo, interdependente. O lago pode ser artificial, mas o resultado é de um encanto real e inquestionável.
O cassino foi o primeiro prédio a ser construído. Ganhou lugar de destaque em uma pequena península. Merecido. O edifício é marcado pela alternância de volumes planos e curvos, reforçados pelos jogos de luz e sombra. A antiga recepção e o salão de jogos dividem uma caixa ortogonal quase quadrada. A curva é feita no bloco posterior, em semicírculo, na parede do térreo e na marquise irregular. Já o lugar para danças e espetáculos ganha movimento, como deveria ser, no tambor oval sobre colunas.
As retas verticais opostas ao plano horizontal da construção denunciam que não há regras — o retilíneo e os meandros harmonizam-se. A grande obra ganha leveza com suas colunas finas que permitem um leve avanço da marquise, enquanto o vidro que rodeia o edifício é o grande responsável pela luz e pela comunicação entre interior e exterior. A vista é privilegiada: os jardins são do artista plástico e paisagista paulista Burle Marx, o que se repete em todo o complexo. Para a execução da obra, Niemeyer contou, ainda, com a colaboração do engenheiro de estruturas, e também poeta, Joaquim Cardoso.
Na entrada, uma guardiã, a escultura em bronze intitulada “Nu”, do polonês August Zamoiski. No jardim, estão obras de três mineiros consagrados: as estátuas, “O abraço”, de Alfredo Ceschiatti; “Sem nome”, de José Alves Pedrosa; e “A porta”, de Amilcar de Castro, esta última completa o conjunto próximo à lagoa. O local é um centro de arte por si só. Se antes o edifício inspirava o lazer, o jogo e o encontro, hoje cumpre bem a nova função. Com a proibição do jogo de azar no Brasil, em 1946, o cassino foi obrigado a fechar as portas e atualmente abriga o Museu de Arte da Pampulha (MAP), o principal centro de divulgação de arte contemporânea em Minas Gerais. São mais de 900 obras, dentre elas, quadros de Cândido Portinari, Alberto da Veiga Guignard, Di Cavalcanti, Amilcar de Castro e Tomie Ohtake.
No interior da casa, impressionam, além de todo o projeto e da decoração, os painéis do italiano, radicado em São Paulo, Alfredo Volpi e do carioca Paulo Werneck. Ambos reforçam os traços da arquitetura moderna de Oscar Niemeyer por meio das parcerias firmadas — colocando a arte e a arquitetura como cúmplices.
Encontro de fé em uma obra-prima
Uma das mais admiradas obras do conjunto é a Igreja de São Francisco de Assis. A obra foi concluída em 1944 e é marcada por uma abóbada parabólica de concreto armado. Um único elemento é suficiente para construir o teto e as paredes. Assim, o templo ganha uma unicidade estrutural, um poder de sustentação que, para olhos amadores, pode ser quase celestial. A curva predomina e é ressaltada pelo contraste diante dos elementos retilíneos do campanário e da marquise da entrada, o que confere à obra um caráter flexível e assimétrico. O jardim de Burle Marx mais uma vez surpreende e rodeia a igreja como se a protegesse com uma bela e sensível armadura.
Candido Portinari é o autor da composição azul e branca de azulejos que cobre a fachada posterior da capela e as laterais baixas, repletas de peixes e pássaros, e o curvilíneo púlpito. Ao entrar na igreja, os olhos vão direto para o altar, onde está o mural de São Francisco, primorosamente realizado pelo mesmo artista. A luz entra com facilidade e ilumina diretamente a obra, de caráter expressionista, na qual o santo se desapega de seus bens materiais. Um elemento instigante é a imagem do cachorro ao lado dele, ao invés do tradicional lobo. Para a professora Mônica Fonseca, coordenadora do Inventário do Patrimônio da Arquidiocese de Belo Horizonte, “o cachorro representa o mais fiel ser, generoso, desprendido, que entende o outro e fica ao seu lado, independentemente de raça ou status social. Como pregava São Francisco”. Portinari também deixou evidenciar sua maestria artística na “Via Sacra’’, constituída por 14 painéis.
Há, ainda, no batistério, os baixos-relevos de Alfredo Ceschiatti, que retratam, em painéis de bronze, a expulsão de Adão e Eva do paraíso. O batistério se junta ao altar, ao coro, ao púlpito, ao campanário e à sacristia para formar um ambiente tipicamente religioso. Apesar disso, durante 14 anos, o templo não foi reconhecido pela igreja católica, que dizia que a construção ia contra as tradições. A primeira missa só foi autorizada em 1957. Se por anos faltou reconhecimento religioso, o artístico foi quase imediato: em 1947 a igreja e suas obras de arte foram inscritas no Livro de Tombo das Belas Artes do Serviço do Patrimônio Artístico e Nacional. Hoje, a fé diante da releitura de símbolos religiosos e o encantamento diante da arte deixam todos que visitam a igreja de joelhos.
Cosmopolita, por que não?
Belo Horizonte, no entanto, ainda vai muito mais além, já que essa jovem capital de 120 anos se revela uma metrópole cada vez mais cosmopolita. Como não se render, por exemplo, ao charme de lugares como a Savassi e a Rua Sapucaí, no Bairro Floresta? — de onde se tem o mais belo skyline do centro da cidade e de onde se veem agora os lindos grafites que decoram alguns prédios do Hipercentro .
Vamos à Savassi: a ainda charmosa região é um lugar de passagem indispensável para o perambulante. Tanto para andar à toa quanto para trabalhar. Na verdade, no que se refere à labuta diária, a Savassi funciona mais como referência para encontros e reuniões ou ainda para se ter notícias sobre a quantas anda o sempre imprevisível mercado de trabalho. É também um lugar inspirador para quem depende de um mínimo de criatividade para conquistar os melhores objetivos do ofício que exerce.
Se caminhar despreocupadamente pelos quarteirões fechados da região e mesmo ao longo das avenidas Getúlio Vargas, Contorno e Cristovão Colombo torna-se um exercício de observações de um cotidiano efervescente que tem lá inegavelmente a sua beleza — mesmo convivendo com a inclemente dureza da realidade que exige imensos sacrifícios de todos que labutam em busca do sustento e, o que é muito triste, testemunhando um colossal aumento da pobreza, geradora de muitos desvalidos, desassistidos e abandonados. Há ainda as consequências óbvias (de um país em constante crise), refletidas na violência dos assaltos e arrombamentos de pontos comerciais.
Mas flanar pela Savassi é transitar entre livrarias e cafeterias. É sentar por alguns preciosos minutos em uma cafeteria e sorver, saboreando com muito gosto, um café expresso. A depender do tempo disponível, dá para passar em duas ou até três cafeterias no prazo de um dia. É muito bom, traz sempre boas energias. Melhor ainda é garimpar bons livros em oferta nas livrarias: dos clássicos à cultura pop, tem de tudo.
Ainda mais precioso no dia a dia da Savassi é quando amigos de longa data se encontram na cafeteria para jogar conversa fora. É sempre após o horário de almoço, não precisa marcar dia e hora, tem sempre alguém lá em volta da mesa que parece estar eternamente reservada para a trupe. O papo rende. Futebol, cultura, política, trabalho… tudo ao mesmo tempo agora. Tudo é falado e discutido, os debates calorosos — tempos tenebrosos da política e as muitas divergências — e a paixão pelo futebol, muitos embates e as inescapáveis gozações. Esse encontro é permanente, cresce e torna mais fortes a cada dia os laços de amizade entre pessoas de ideias, ofícios e posicionamentos distintos. Porém, não há diferenças — e sim unanimidades — quando os conceitos vão ao encontro da tolerância, do respeito, da dignidade, da honestidade e da ética e, é claro, dos anseios por uma vida melhor para todos — tendo como princípios fundamentais a justiça social e a redução das desigualdades.
“Região da Savassi”
Do longínquo ano de 1939 até o início da década de 1990, a história separa a inauguração da Padaria e Confeitaria Savassi — propriedade de uma família de imigrantes italianos comandada pelo padeiro Amílcare Savassi — do momento em que um projeto de Lei aprovado na Câmara oficializou a “Região da Savassi”. “Começa na Praça Tiradentes, na confluência da Av. Brasil com Av. Afonso Pena. Segue a Av. Brasil até a Praça da Liberdade, incluindo toda a praça, sobe pela Rua da Bahia até a Av. do Contorno, segue esta até a Praça Milton Campos, e dali pela Afonso Pena até a Av. Brasil, fechando sua delimitação na Praça Tiradentes”.
A região da Savassi na verdade está inserida no Bairro Funcionários, cujo nome é uma analogia aos servidores públicos vindos de Ouro Preto para a então nova capital de Minas Gerais. O bairro foi erguido nas proximidades do Palácio da Liberdade, com a construção de cerca de 200 residências para abrigar esses trabalhadores. O interessante é que essas casas eram classificadas em um nível de A a F, para diferenciar o nível hierárquico de cada funcionário público.
Nos anos de 1950, o nome Savassi já definia o lugar. Era frequentado pela elite e pelos estudantes de escolas próximas, sobretudo do Colégio Padre Machado. Foi nessa década a inauguração do famoso Cine Pathé.
Os anos de 1960 foram marcados pela chegada do obelisco da Praça Sete de Setembro — o “pirulito” — e a expansão do comércio. Os anos 1970 consagraram o lugar como referência comercial e de lazer, além de ser o ano da retirada do “pirulito”, que voltou para a Praça Sete. Os primeiros quarteirões fechados surgiram nos anos de 1980, assim como o auge das badalações noturnas e também diurnas — em razão do dinamismo do comércio, com muitas lojas e butiques, além das diferentes opções em bares, restaurantes e boates.
Entre meados dos anos de 1990 e 2000, a Savassi viveu um período de decadência, muito em função do surgimento dos shopping centers. A revelada vocação para abrigar cafés e livrarias foi decisiva para o ressurgimento do bairro. Até que vieram as obras de revitalização.
Com investimento de R$ 11, 8 milhões, os quarteirões das ruas Pernambuco e Antonio de Albuquerque foram revitalizados com a criação de calçadões exclusivos para pedestres, equipados com luminárias e diferentes tipos de bancos para descanso e contemplação. Destaque para a instalação das quatro fontes chamadas “interativas”, pois permite o contato das pessoas. A água é reaproveitada e recebe tratamento químico e biológico de uma casa de máquinas. Ela circula e é novamente lançada pelos jatos, que são programados para atingir no máximo 1 metro de altura.
Não há dúvidas que as fontes se transformaram em interessantes atrativos: ao redor delas, se vê de tudo. Casais de namorados em idílio romântico, idosos em contemplação, transeuntes que param para um instante de descanso, artesãos que descobriram o ponto ideal para expor suas criações. As fontes não passam despercebidas pelas crianças, sempre encantadas com o movimento das águas. Elas são agora um recanto para a interação entre pais e filhos, sobretudo para as crianças de menor idade. Infelizmente, é também o lugar escolhido para morada pelos desvalidos que fazem dali um ponto estratégico para garantir a esmola de cada dia. Ao redor dos jatos d’água, a pobreza faz questão de mostrar a face mais chocante em meio a uma efervescência cotidiana que segue sem cessar.
À noite, os signos da cidade são ainda mais expostos: quase todas as tribos urbanas fazem dali o ponto de convivência. Desde os senhores de terno e gravata batendo ponto no happy hour aos indomáveis skatistas exercitando radicais manobras. No universo de um quarteirão, a diversidade (e, em boa medida, a tolerância, graças a Deus) se reúne, identificada pelos trajes que desnudam referências aos góticos, punks, hippies e até aos assumidos cross-dressing. Não passam despercebidos jeans rasgados, piercings, tatuagens, as paixões nas camisas de clubes de futebol, sobretudo as do Cruzeiro e do Atlético. Como não poderia deixar de ser, a elegância da vanguarda fashion — mais do que uma tradição, é uma vocação de BH — desfila pelas ruas. Nesse microcosmo da grande cidade, a liberdade faz questão de se mostrar, identificada em muitos beijos, carinhos e amassos sem ter fim que ignoram as mais caretas convenções — seja de opções seja de gêneros. E assim a Savassi segue o seu curso.
Balaustrada e grafites da Rua Sapucaí
Como que em um grande salto, o perambular pela cidade encontra outro ponto que é um tanto quanto diferente da Savassi, mas que desvela uma beleza notável, algo muito típico de BH, pois resguarda alguns patrimônios arquitetônicos extremamente significativos para a cidade, cujo principal destaque é o casarão — construído nos anos de 1930, em estilo art déco — que foi sede da antiga Rede Ferroviária. É a Rua Sapucaí, no Bairro Floresta, que fica entre dois viadutos, o de Santa Tereza e o da Floresta. A rua, aliás, faz parte do conjunto da Praça da Estação e é um marco urbano de toda a Região Central. Tanto é verdade que há na rua outro importante edifício que precisa ser citado: trata-se do edifício Chagas Dória, também erguido na década de 1930, no mesmo estilo art déco.
É preciso lembrar que, ao longo da velha balaustrada sobre a Praça da Estação, surgiu um fantástico corredor gastronômico e cultural. Tudo começou com a inauguração, em 2012, da casa Salumeria Central. Hoje, charmosos bares, restaurantes e cafés tornaram-se atrativos irresistíveis da rua.
Porém, a atenção aqui é dedicada à deslumbrante vista que se tem da capital a partir da Rua Sapucaí. É realmente o mais belo skyline do centro dessa metrópole.
Para embelezar ainda mais o cenário, as chamadas laterais cegas ou empenas (onde não existem janelas) de edifícios do centro da cidade ganharam lindos e gigantescos grafites. Para se ter uma ideia do tamanho das obras de arte, a dimensão de um deles tem 50 metros de altura por 37 metros de largura. Tudo começou com um projeto chamado Circuito Urbano de Arte (Cura). Os organizadores mapearam prédios, tendo como referência a vista da Rua Sapucaí para o Hipercentro de BH. Para a observação dos grafites, foi criado um mirante, também instalado na rua.
Cinco artistas foram convidados para encarar o desafio de colorir as empenas dos edifícios. Os mineiros Priscila Amoni e Thiago Mazza; a espanhola Marina Capdevila e a dupla cearense, de Fortaleza, Tereza Dequinta e Robézio Marques, que formam o Acidum Project. Os cearenses pintaram a lateral do edifício Rio Tapajós, na Rua da Bahia; a espanhola Marina pintou o edifício, na Rua da Bahia esquina com Avenida Afonso Pena. A linda pintura da fachada do Hotel Rio Jordão, na Rua Rio de Janeiro é de autoria de Priscila, e o artista Mazza fez a empena do edifício Satélite, também na Rua da Bahia.
Priscila Amoni foi uma das idealizadoras do Cura. Formada em Belas Artes pela UFMG e mestre em pintura pela Universidade de Lisboa, a artista conta que o Cura foi idealizado por ela e por duas amigas, as produtoras Juliana Flores e Janaína Macruz. “Nós criamos o Cura a partir de um desejo meu e também do Thiago Mazza de fazer pinturas grandes e na rua”. Priscila aproveita para esclarecer uma questão importante: “eu não me considero uma grafiteira. Eu sou uma pintora. Não faço uso do spray em nenhum momento, nem para finalizar o trabalho. Eu realmente uso é rolinho e pincel, pois é o que me aproxima da técnica de pintar quadros, que é de onde eu venho. E eu venho da pintura de ateliê”.
O passo seguinte foi o encontro com as amigas e partir para a ação. “Juliana, Janaína e eu criamos um sonho”, diz ela.
O complemento luxuoso do projeto veio com a ideia da montagem do mirante na Rua Sapucaí para o público acompanhar a jornada dos artistas.
Hoje, com as pinturas prontas, o mirante tornou-se um belo e irresistível atrativo (sem exageros) da cidade. A combinação entre o lindo skyline do Centro de BH visto da Rua Sapucaí com os agradáveis e muito interessantes bares e restaurantes da rua, além dos parklets lá instalados, valoriza de forma impecável a bela vista das pinturas — que, por sua vez, dão outra vida aos prédios do Hipercentro.
“É muito bonito ver esse sonho virar realidade”, diz Priscila Amoni. Ela acrescenta, cheia de razão, que “esse recorte visual”, que pode ser visto de um único ponto da Sapucaí, “é algo inovador no mundo”. A pintora faz questão de enfatizar um significado muito importante do projeto Cura: “tudo aconteceu a partir do desejo de fazer algo o mais democrático e acessível, uma arte para todos”.
A pintura estampada na fachada do Hotel Rio Jordão, segundo a criadora da obra, “é algo maior do que eu consigo analisar, pois fiz esse trabalho com muita responsabilidade; fazer essa pintura na minha cidade, para os meus conterrâneos, é uma realização maior do que algo pessoal, vai muito além de mim”. Priscila ainda ganhou mais um interessante motivo para se alegrar: a sua pintura é considerada a maior já realizada por uma mulher na América Latina.
Praça Sete marco zero
Se a grande questão é o perambular pela capital de todos os mineiros, como não contar algumas coisas sobre a Praça Sete de Setembro? O cruzamento das avenidas Afonso Pena e Amazonas é um turbilhão. Milhares de pessoas circulam por ali diariamente, em ritmo sempre frenético, e parecem desconhecer o que se ergue em volta. Outras tantas gentes precisam da praça para sobreviver. A começar pelos desvalidos de tudo — paupérrimos mendigos e moradores de rua que conseguem ali as migalhas dos restos de alimentos e as parcas esmolas que os mantêm pelo menos vivos. Há também uma farta trupe que tenta vender os seus produtos — de artesãos a camelôs, que, aliás, apesar da ilegalidade, voltaram a ocupar as ruas da cidade. Há ainda o comércio formal, que, de tantas opções, fica difícil listar, por exemplo, a grande quantidade de bares, restaurantes e lanchonetes, além das bancas de jornais e revistas.
Porém, é essencial destacar um ponto muito tradicional: o Café Nice. Fundado em 1939, o lugar é um símbolo não só da Praça Sete, como também de BH. Sem mesas nem cadeiras, o Nice atende os apressados em busca de um cafezinho coado, de qualidade, cujo sabor é muito apreciado. É claro que, para acompanhar o café, a melhor pedida é o indispensável pão de queijo. A cafeteria é ponto de encontro de muita gente: “batem ponto” por lá todos os dias (e isso acontece desde a fundação) muitas pessoas que trabalham nas proximidades e muitos aposentados. E simplesmente não existe político que não passe no Café Nice durante uma campanha eleitoral.
Outros atrativos da praça que não passam despercebidos são os pontos que reúnem os jogadores de xadrez. Eles se concentram nos quarteirões fechados da Rua Carijós, entre Amazonas e São Paulo; da Rua Rio de Janeiro, entre Afonso Pena e Tamoios, e da Rua Carijós, entre Espírito Santo e Afonso Pena. Os pontos existem desde os anos 1970, criados inicialmente pelos jogadores de damas.
A Praça Sete ganhou esse nome exatamente no dia 7 de setembro de 1922, em homenagem ao centenário da Independência do Brasil. Curiosamente, o seu símbolo maior, o obelisco — ou melhor, o “pirulito”, como é chamado por todos os belo-horizontinos —, foi inaugurado dois anos depois. O monumento foi um presente doado pelos habitantes da antiga Capela Nova do Betim, a atual cidade de Betim. O “pirulito” foi esculpido em granito e é formado por uma agulha de 7 metros que se apoia em um pedestal quadrangular adornado por um poste em cada um de seus vértices. O desenho é de autoria do arquiteto Antônio Rego, mas foi construído pelo engenheiro Antônio Gonçalves Gravatá, então proprietário de uma pedreira na vizinha Betim, de onde foram extraídas as pedras utilizadas na construção do famoso obelisco.
Em 1963, em meio à primeira grande reforma realizada na praça — quando foram arrancadas as então frondosas árvores que faziam BH ser conhecida como a “cidade jardim” —, o “pirulito” foi parar na Praça da Savassi, de onde só retornou no ano de 1980. Nove anos antes, em 1971, outra reforma fez a configuração atual da Praça Sete, com quatro quarteirões fechados. Em 1981, esses quarteirões ganharam nomes em homenagem aos povos indígenas que vivem em Minas Gerais: o trecho da Rua dos Carijós, entre a praça e a Rua São Paulo, chama-se Krenak; Pataxó (Rua dos Carijós até a Rua Espírito Santo); Maxacali (Rua Rio de Janeiro até a Rua dos Tupinambás); e Xacriabá (Rua Rio de Janeiro até a dos Tamoios).
É preciso informar, é claro, que estão na Praça Sete alguns dos mais importantes ícones da arquitetura belo-horizontina — que juntos formam um precioso conjunto do patrimônio histórico dessa jovem metrópole de 120 anos.
Uma das edificações mais emblemáticas do estilo art déco em Belo Horizonte, o Cine Theatro Brasil — inaugurado em 1932, na esquina da Avenida Amazonas com a Rua dos Carijós — chegou a ser um dos prédios mais altos da cidade. Se hoje isso parece inacreditável, diante dos novos prédios ao redor, nada mudou quanto ao charme representado pela obra, ainda evidente. A primeira construção déco da capital foi projetada pelo arquiteto Alberto Murgel. O pioneirismo arquitetônico do Cine Theatro Brasil traçou o caminho para que Belo Horizonte se tornasse uma das cidades brasileiras com maior presença de art déco. Inicialmente, o Cine Brasil, como era conhecido, era um espaço para teatro, ópera, música e, é claro, cinema — tendo sido, um dia, o maior cinema do país. O prédio foi tombado pelo Iepha, mas fechou as portas em 1999 e assim permaneceu por 14 anos. Sobreviveu apenas na memória dos antigos frequentadores até que, em 2006, foram iniciadas as obras de restauração, que durariam sete anos.
O Cine Theatro Brasil Vallourec ganhou dois teatros, um, com 1.000 lugares, e outro, com 200. A cultura ganhou novos espaços, com galerias para exposições de artes visuais, área de eventos, restaurante, loja e áreas de convivência.
A esquina da Afonso Pena com a Rua Rio de Janeiro ganhou, em 1950, um imponente edifício em estilo modernista, que passou a ser conhecido como edifício do Banco da Lavoura. O valor do projeto arquitetônico ousado (finalizado em 1946), de autoria do arquiteto Alvaro Vital Brasil, foi logo reconhecido: ganhou o prêmio de arquitetura da 1ª Bienal de São Paulo, que aconteceu no ano de 1951.
Tratando-se de arquitetura modernista, não poderia faltar Oscar Niemeyer no marco zero de BH. O grande arquiteto projetou, em 1951, o prédio do Banco Mineiro da Produção, que foi inaugurado no ano de 1953, embelezando a esquina da Rua Rio de Janeiro.
Outro ícone da Praça Sete é o prédio que representa a arquitetura em estilo eclético. Projetado pelo italiano Luís Olivieri, o edifício trazia para BH a influência do ecletismo europeu, que simbolizava principalmente o apogeu da inovação e dos tempos modernos, além de demonstrar a riqueza e o poder de uma classe social dominante. No ano de 1941, tornou-se sede de outro banco, o Hipotecário e Agrícola do Estado de Minas Gerais. Hoje, a ainda bela construção abriga o Posto de Serviço Integrado Urbano (Psiu).
E assim segue a vida na praça que assinala o círculo central de Belo Horizonte. A história permanece representada pelos monumentos, enquanto as pessoas ainda vão continuar passando apressadas pelas calçadas, da mesma forma que os intermináveis turbilhões de veículos seguirão pelas duas grandes avenidas adentro. Enquanto isso, os skatistas manobram radicalmente e os jogadores de xadrez lutam pelo xeque-mate. Isso sem acrescentar as outras inúmeras tribos que seguirão construindo a vida dentro daquele universo, mas isso já é outro assunto.
Como são várias as trilhas da cidade, cabe ao “perambulante” escolher os seus caminhos prediletos. Os 4,3 quilômetros da Afonso Pena, entre as praças Rio Branco e da Bandeira, mereceriam apaixonadas observações. E, no meio do caminho, como deixar passar despercebida, por exemplo, a Rua da Bahia? Uma vez nessa rua, como não falar do Edifício Maletta?, que hoje em dia retoma a gloriosa fama de irresistível polo da cultura, da gastronomia e da boemia. Consagrado como ponto de encontro de artistas e intelectuais da cidade, o prédio da década de 1950 foi novamente tomado por bares descolados e restaurantes vegetarianos. No primeiro andar, continua lá a tradicionalíssima Cantina do Lucas, em funcionamento há mais de 50 anos. Subindo as escadas, a diversidade é imensa: várias tribos frequentam os diferentes bares da varanda do segundo andar — de onde se tem uma bela vista dos arredores.
Porém, não há meio-termo, subir a Rua da Bahia merece um capítulo à parte. O melhor é retornar para a Afonso Pena e apreciar o verde do Parque Municipal aprisionado pela selva de concreto. Essa preciosa área verde já constava do projeto que planejou a construção de BH. O parque chegou a ter incríveis 555 mil metros quadrados. Hoje, ocupa 182 mil metros quadrados, abriga 280 espécies de árvores e três lagos. O maior encanto do Parque Municipal Américo René Giannetti (nome oficial) é a característica de espaço democrático, livre para ser aproveitado das melhores maneiras possíveis. Além do mais, é um oásis para a gente humilde dessa grande cidade. É bom lembrar que está lá dentro, desde os anos 1950 o Teatro Francisco Nunes, projetado em linhas modernistas por Luiz Signorelli. Em 2014, ganhou uma ampla restauração e teve a infraestrutura totalmente modernizada.
Também junto ao Parque Municipal, é impossível ignorar o memorável Palácio das Artes, o palco maior da cidade — de todas as formas e expressões da arte, como bem lembra o nome. Inaugurado no ano de 1971, o complexo arquitetônico ocupa 18 mil metros quadrados, cujo projeto original foi assinado por Oscar Niemeyer.
Pois é, após perambular por todos esses lugares, contar algumas histórias e enumerar informações que não podem passar despercebidas, o que resta a fazer é sentir o clima sempre diferente da Praça do Papa. Aos pés da Serra do Curral, a 1.100 metros de altitude, o vento que lá sopra constantemente abranda ou até faz cair a temperatura.
Esse abençoado lugar da cidade não à toa foi escolhido para receber o papa João Paulo II, no ano de 1980. Cerca de 2 milhões de pessoas ouviram do pontífice: “Vocês podem olhar as montanhas atrás e dizer belo horizonte. Vocês podem olhar a cidade à frente e dizer belo horizonte. Mas, sobretudo, quando se olhar para vocês, se deve dizer: Que Belo Horizonte!”.
Após a visita do papa, a prefeitura e a Cúria Metropolitana decidiram construir uma praça como um grande marco da histórica visita. Com a inauguração em 1983 — o nome oficial é Israel Pinheiro —, a população se encarregou de nomeá-la, para todo o sempre, como Praça do Papa. Logo em seguida, foi erguida a bela escultura “Monumento à paz”, de autoria do escultor Ricardo Carvão Levy.
Com 24 metros de altura por 10 metros de face e 2 metros de largura, a obra de arte, que pesa 92 toneladas, é composta por três chapas de aço; duas delas têm forma triangular e a terceira forma um retângulo. A parte superior da peça, que aponta para o alto, representa a fé em Deus; já a parte inferior simboliza a bênção de Deus; o equilíbrio entre a fé e a bênção seria representado pela parte que divide os dois lados. Ao lado ergue-se a cruz, símbolo maior da cristandade.
Para fechar essa saga de perambular por BH — e desde já antecipar que muitos outros capítulos ainda virão por aí —, o melhor agora — envolto pela luz de um lindo crepúsculo de quase final de primavera — é apreciar a vista do alto do Mirante das Mangabeiras. É um belo lugar para se refletir, pensar na vida e, em paz, reconhecer: é bom demais (com o típico sotaque belo-horizontino) viver em Belo Horizonte.