Como escala de cada fotografia, a dimensão do sentimento humanista: a fotógrafa Ísis Medeiros conta a história das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem em Brumadinho.
Por Juliana Afonso
Assim que soube do rompimento da barragem de Córrego do Feijão, em Brumadinho, a fotógrafa Ísis Medeiros arrumou as coisas e pegou a estrada. “Eu não sabia a dimensão do que tinha acontecido, mas não pensei duas vezes. Três horas depois, eu já estava lá”, conta Ísis, que foi recebida pela comunidade do Córrego do Feijão, onde passou o dia junto às moradoras e aos moradores em busca de informações.
O primeiro anúncio sobre os resgates chegou à noite e foi lido em meio ao breu. “Não tinha luz nem água. Eu só consegui fazer a foto por causa das luzes dos celulares que filmaram o bombeiro anunciando a lista das pessoas que tinham sido encontradas vivas”. Técnica e intuição permitiram que ela traduzisse em imagens aquele momento impactante.
Desde então, a repórter fotográfica percorre a região com o objetivo de documentar as violações de direitos a que milhares de pessoas têm sido submetidas, seja pela perda de entes queridos, seja pelo abandono forçado das próprias casas, seja pela destruição dos recursos naturais. Esse é o propósito que guia a carreira de Ísis desde 2015, quando trabalhou na cobertura do criminoso rompimento da barragem de Fundão, em Mariana.
Para conseguir trazer uma perspectiva mais humana aos registros, a fotógrafa busca estar próxima das pessoas. “As imagens que normalmente são divulgadas têm uma escala muito grande. São fotos abertas, que mostram a área que a lama atingiu, mas com pouca dimensão humana. A maior parte das minhas fotos não é aérea. O que eu busco é proximidade, olho no olho”.
Ísis critica a “cobertura midiática ostensiva e pouco cuidadosa”, posicionamento que, segundo a fotógrafa, fortaleceu a relação dela com a população atingida. Com o tempo, essa boa relação lhe possibilitou transitar entre o fotojornalismo e a fotografia documental. “Eu dava notícias em tempo real sobre o que acontecia, mas tinha o entendimento de que meu trabalho era de longo prazo”.
A imersão nesse universo provocou mudanças. “No processo eu percebi que minhas imagens ganharam tons mais escuros, com um tratamento cada vez mais sombrio”. Foi então que ela notou que o trabalho feito até ali era muito colorido e que essa mudança refletia uma transformação de fora para dentro, o que alterou o olhar de Ísis e a forma como ela reproduzia isso nas fotos. “Eu comecei a ver muita injustiça e a perceber como mascaram o que acontece em Minas Gerais.”