Turismo de experiência nas margens do Velho Chico

Por do sol no Lago de Três Marias.

Os municípios de São Gonçalo de Abaeté — no distrito de Beira Rio — e Três Marias desenvolvem, com ótimos resultados, novas experiências turísticas criadas e desenvolvidas pelo Projeto de Desenvolvimento Integrado do Turismo.

Por Cezar Félix (texto e fotos)

Ponte sobre o Rio São Francisco na BR 040 entre Três Marias e São Gonçalo do Abaeté.

Após a grande barragem de pedra que formou o Lago de Três Marias, o rio São Francisco desce veloz cumprindo o seu destino de “rio da integração nacional” ao cortar os grandes estados de Minas Gerais e Bahia até chegar ao Atlântico na divisa de Sergipe com Alagoas. Mas é em um pequeno trecho do rio, logo depois da barragem, que o Velho Chico faz a divisa entre os municípios de Três Marias (na margem direita) e São Gonçalo do Abaeté (na margem esquerda).

A imponente ponte da BR-040 liga um município ao outro e, no caso do segundo, ao seu distrito chamado, não à toa, de Beira Rio. Pois é nessa região que foi estruturado o Projeto de Desenvolvimento Integrado do Turismo Beira Rio e Três Marias, promovido pela companhia Nexa por meio do Instituto Votorantim e realizado pela Turismo 360 Consultoria.

A reportagem desta Revista Sagarana, a convite da Turismo 360º Consultoria, do Visite Beira Rio e do Descubra Três Marias, vivenciou as seis novas experiências turísticas criadas e desenvolvidas pelo projeto.

Experiências turísticas e as belezas do lago e do rio.

Gastronomia, prato preferido de JK

Uma delas aconteceu na cidade de Três Marias e foi relacionado à gastronomia típica. O palco foi o Restaurante Diadorim, dirigido por Janete da Silva. Ela serviu três deliciosos pratos de peixes do rio e do lago, sendo que o prato principal foi a experiência gastronômica Surubim à moda de Três Marias. Janete explica que é “um resgate desse prato que o ex-presidente Juscelino Kubistchek apreciava quando vinha a Três Marias”. Antes, aconteceu a original apresentação do grupo Contadores de Estórias Manuelzão, que entoou belas canções tradicionais, além das leituras de trechos das obras-primas literárias de João Guimarães Rosa.

Experiência gastronômica Surubim à moda de Três Marias.

Na avaliação de Janete, trata-se de um “projeto maravilhoso”, que proporcionou a união entre os empresários de São Gonçalo e de Três Marias. “Nós, os empresários, nos encontramos em diversas oportunidades e desenvolvemos juntos esses projetos”, destaca ela. Janete argumenta que o “turismo sempre acontece, mas até mesmo para acontecer, é preciso que haja uma direção”.

O Grupo Contadores de Estórias Manuelzão com Janete Silva.

A empresária acredita que o projeto “aconteceu em um momento muito bom e foi muito bem”, elogia. “Foi tudo muito positivo e eu estou contente com os resultados. A experiência gastronômica é fantástica, tenho certeza do sucesso,  acredito no projeto e só vejo alegria em tudo. Vai deslanchar com tranquilidade. A gente faz a nossa parte, mas as diretrizes traçadas pelo Projeto de Desenvolvimento Integrado do Turismo fortaleceu muito”, arrematou a proprietária do Restaurante Diadorim.

A gastronomia típica como atrativo.

Gastronomia regional  

Também no quesito gastronomia, houve a visita à Pousada e Restaurante Maria das Flores, de propriedade do casal Regina Severino e Tarsílio Paiva onde a principal atividade foi a experiência — muito interessante, aliás, devido à alta qualidade da comida — de degustação dos pratos com peixes, frutos e flores do Cerrado, preparados pela chefe de cozinha Regina Severino, que também foram atrações das edições do Festival Gastronômico de Três Marias.

Gastronomia regional na Pousada e Restaurante Maria das Flores.

Segundo Regina, a proposta do Projeto de Desenvolvimento Integrado do Turismo Beira Rio e Três Marias “vem de encontro às nossas expectativas quanto à divulgação da gastronomia regional, valorizando os frutos do cerrado, bem como os peixes da represa de Três Marias e do Rio São Francisco”, diz ela. “Além da gastronomia, temos as riquezas e belezas naturais tais como: cachoeiras, riachos, as veredas e também o resgate da cultura regional do congado, da ‘contação’ de histórias, do desfile de carros de boi e não deixando de mencionar o acolhimento e a boa prosa. O turismo de experiência é o que faltava para consolidar a proposta de divulgação do destino ‘Visite Beira Rio’ e ‘Conheça Três Marias’”, conclui.

O casal Regina Severino e Tarsílio Paiva.

Regina salienta que ao receber o turista na Pousada e Restaurante Maria das Flores “nos preocupamos em proporcionar para aquele que chega um momento especial de degustação dos pratos dos Festivais Gastronômicos de Três Marias, onde apresentamos os peixes e os frutos do Cerrado que é uma experiência única. Além da gastronomia, proporcionamos uma imersão no Cerrado onde mostramos as espécimes de árvores nativas, seus frutos e também os pássaros”, acrescenta. “As pessoas que aqui chegam ficam encantadas com tanta beleza e exuberância natural”.

Uma das trilhas da Pousada das Flores.

Andrequicé e Manuelzão

A outra vivência foi no pequenino arraial de Andrequicé, distrito de Três Marias, conhecido por ter sido a morada do vaqueiro Manoel Nardi, o Manuelzão — o líder da comitiva de boiadeiros que foi acompanhada por João Guimarães Rosa na viagem de 280 km entre a Fazenda Silga, localizada no distrito, e Araçaí. A jornada inspirou a escrita do grande clássico Grande Sertão: Veredas.

Casarão que é um patrimônio histórico do Andrequicé.

A visita teve início na sede do Ponto de Cultura Memorial Manuelzão, administrado pela Samarra — Sociedade dos Amigos do Memorial Manuelzão e de Revitalização de Andrequicé. A entidade foi fundada em julho de 2004, durante as comemorações do centenário de Manuelzão na III Semana Cultural “Festa de Manuelzão”.

O museu dedicado ao vaqueiro Manoel Nardi, o Manuelzão.

A primeira atividade foi a proposta de experiência baseada em uma leitura coletiva de trechos de livros de Rosa, ação que tem o objetivo de “resgatar, preservar e divulgar a literatura de Guimarães Rosa, e transformar o bicentenário distrito de Andrequicé em um pólo de turismo histórico, cultural da literatura de Rosa no Sertão Mineiro”, conforme divulga a Samarra. Em seguida, o Grupo de Dança Corpo de Baile — formado por adolescentes —,  apresentou a emocionante coreografia “Dança Cigana”.

A dança cigana do Grupo de Dança Corpo de Baile.

Além de ter sido um lugar de grande movimento de tropas, o lugarejo também atraiu os ciganos, que deixaram lá marcas expressivas de sua cultura. Outras experiências foram as visitas às Bordadeiras de Andrequicé, senhoras da terceira idade que bordam temas ligados às belas paisagens e às histórias do sertão e ainda a muitas referências à obra de Rosa. Nas atividades ligadas à arte e cultura, a Samarra informa que “desenvolve suas atividades artísticas e culturais, prioritariamente com crianças, adolescente e jovens carentes em situação de vulnerabilidade social e trabalha também com grupos de Terceira Idade, que se inclui principalmente no Grupo de Bordadeira de Andrequicé”.

A agenda de visitação também incluiu o Museu Manuelzão, localizado na antiga casa do vaqueiro, e a Igreja de Nossa Senhora das Mercês, erguida na primeira metade do século XVIII.

Bordadeiras de Andrequicé, senhoras que bordam temas ligados às belas paisagens e às histórias do sertão.

Para José Antônio Vicente de Souza Presidente da Samarra, o Projeto de Desenvolvimento Integrado do Turismo foi importante “pois reestruturou as iniciativas de experiências de Turismo Literário da Samarra e os resultados são visíveis, que vão desde as assessorias para criação do Roteiro Turístico “Visita a Andrequicé – introdução ao Mundo de Manuelzão,  incluindo precificação à divulgação e comercialização, o que possibilitou incrementar as atividades existentes de visitação ao Museu Manuelzão e a outros patrimônios culturais da Bicentenária Vila de Andrequicé e do Caminho da Boiada de Guimarães Rosa, no Município de Três Marias, cenários  vivos da Literatura Roseana, que encanta o mundo, com geração de renda para artistas e outros moradores da Comunidade”.

Detalhe de um dos lindos bordados.

Um recanto em pleno sertão

Um caso à parte é a experiência de visitar uma pequena propriedade localizada em na região chamada de Ribeiro Manso no meio do Cerrado, que ainda conserva muito do bioma e traz todas as características da plenitude do sertão. O lugar é o Recanto da Zezé — apelido carinhoso de Maria José da Silva, a adorável proprietária — e a experiência é a Trilha, Cachoeira e Gastronomia Mineira.

Vista parcial do quintal do Recanto da Zezé.

O caminho até lá já proporciona lindos visuais do bioma Cerrado. Na chegada, um belo café rodeado de quitutes mineiros e de outras delícias da roça, preparados com esmero e carinho por dona Zezé. A casa dela, toda a área do quintal (com as várias galinhas, os cães, árvores frutíferas e as hortaliças cultivadas) e o fogão à lenha já são atrativos de grande originalidade. A humilde moradia foi construída com adobe é coberta por palhas de buriti assim como o pequeno abrigo onde fica o fogão, também de adobe. Ela faz questão de mostrar com orgulho os cômodos do lar onde ela criou os filhos

A humilde moradia de dona Zezé.

Alguns metros ­­à frente, por uma trilha, chega-se a uma inacreditável plantação de cerca de 40 mil pés de abacaxi. Todos plantados e cultivados por ela. Como se não bastasse, há ainda o cultivo de maracujás e de alguns pés de café. Entre novembro e janeiro, o visitante pode acompanhar a colheita do abacaxi e, em julho e agosto, a do maracujá. Nesses caminhos, ainda é possível colher e saborear frutas típicas do Cerrado como cagaita, gabiroba, araçá e cajuzinho do campo.

Dona Zezé no fogão a lenha.

A programação segue com um passeio à Cachoeira das Palemiras. A trilha, bem sinalizada e de dificuldade moderada, permite muitas contemplações do bioma, dentre campos floridos, matas de galeria, cânions e grotões, dentre outros. O poço convida a um mergulho reparador e a cachoeira revela muitas águas no período chuvoso, mas quase não aparece no período de seca. Porém, a beleza do lugar é perene.

Turistas na trilha que leva à plantação de 40 mil pés de abacaxi.

Na volta, mais um deleite: o farto almoço, tipicamente mineiro dos gerais, preparado por muito capricho por dona Zezé. A nossa visita foi presenteada com o tradicional prato frango com açafrão acompanhado de quiabo, farofa e variada salada. Todos os ingredientes e o frango, é claro, vieram do quintal. Como complementos obrigatórios arroz e feijão.

A bem sinalizada trilha que leva à cachoeira.

Ensinando a pescar

A pesca esportiva no lago de Três Marias é um outro grande atrativo que entrou no radar do projeto conduzido pela Turismo 360º. Daí então surgiu a  experiência “A Arte da Pesca e Preparo do Peixe”, que aconteceu em um dos braços do grande reservatório onde localiza-se o Calangal Pesca. A proposta é vivenciar um dia de pescador, inclusive para quem nunca soube manejar uma vara de pescar. Acontece então um curso teórico sobre a pesca esportiva ministrado por dois profissionais da equipe local, o simpático casal Josi e André.

Na beira do lago para aprender a modalidade pesca de barranco.

Ele ensina com riqueza de detalhes as técnicas adequadas para preparar e montar a vara — ou seja, nós, linhas, carretilhas, molinetes e iscas — para a pesca do tucunaré. O pescador mostra como colocar a isca de modo que os peixes não se machuquem e possam se recuperar rapidamente. Há ainda as explicações sobre importância de devolver o peixe de volta ao rio após a pesca.

O casal Josi e André e as lições da pesca esportiva.

A próxima etapa é ir para a beira do lago e aprender como arremessar linha e isca na água na modalidade pesca de barranco. Depois acontece o embarque em um barco de alumínio com motor de popa até um local adequado para a “pescaria embarcada” na modalidade “pesque e solte”.  O tucunaré é um peixe nativo da bacia Amazônica que foi introduzido no lago de Três Marias. A espécie tornou-se a principal referência da pesca esportiva brasileira, pois proporciona grande emoção ao pescador uma vez que é muito agressiva na defesa de territórios e ninhos.

Na “pescaria embarcada” na modalidade “pesque e solte”.

A experiência termina com mais uma ótima oferta gastronômica, um saboroso prato preparado por Josi: tilápia assada na brasa à moda Calangal, acompanhada de arroz e salada. Em tempo: existem no local os viveiros de criação desse peixe.

Aventura náutica

Ainda no lago de Três Marias, partindo das margens em frente ao bonito Grande Lago Hotel,  a fantástica experiência da vez é o “Passeio Náutico e Piquenique no Doce Mar de Minas”, conduzida pelo Guia Bill. No início do passeio, ele pilota o barco até as proximidades da Usina de Três Marias onde estão as comportas e a grande barragem de pedras. Nessa primeira parada, Bill resume toda a história da construção da usina com grande riqueza de detalhes.

O final de tarde no imenso Lago de Três Marias.

O barco em seguida singra com velocidade as águas da gigante represa. Alguns minutos depois, percebe-se nitidamente a grandiosidade do lago, pois as margens estão muito longe. A sensação é de puro encantamento ainda mais que a tarde findava em uma bela luz. Porém, o mais impressionante estava por vir: as águas invadem algumas reentrâncias e esculpem magníficos cânions. O visual é arrebatador.

O guia Bill conhece todos os detalhesda navegação e da pesca esportiva.

Aventura pelo “doce mar de Minas” continua até Bill ancorar em um local que proporciona uma ampla vista para a imensidão do lago. E o detalhe: de frente para o por do sol. Rapidamente, é montado um indescritível piquenique, com delícias diversas, entre bolos, quitutes e doces da região, além de sucos naturais. Logo surge um estonteante crepúsculo que é brindado com champagne.

O piquenique para apreciar o por do sol.

O Guia Bill também é especialista em conduzir os turistas para a pesca esportiva, principalmente do tão desejado tucunaré azul, espécie que provoca as maiores emoções ao pescador esportivo.

O fato é que, após a descrição de tantos e tamanhos atrativos, é preciso destacar o quanto hoje é importante o apoio às iniciativas que possam viabilizar a efetivação de projetos como esse. Somente o turismo de experiência tem a força de aglutinar todas as potencialidades de uma região tão poderosa em atrativos turísticos em simplesmente todas as vertentes da atividade.

O passeio náutico revela lugares de estonteante beleza como os cânions.

 

 

 

 

 

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